quinta-feira, 22 de setembro de 2016

A TRINCHEIRA DO EVANGELHO E A SUA INADEQUAÇÃO COM OS “ISMOS”

Por que ante alguns equívocos de certos súditos que fazem Missão Integral alguns teólogos e palpiteiros on line são rápidos em denunciar os perigos do comunismo na práxis cristã, mas são tão lentos em combater a demanda do consumismo proposto e doutrinado pelo liberalismo econômico? Vamos refletir sobre isso?

Se o deus do socialismo foi um ditador que obstinado pela ausência de classes ditou e matou, o deus do capitalismo chamado LUCRO, também não poderia ser um ditador (mais bem apresentável) que dita e mata de outras formas? Uma espécie de Mamom político-econômico?

Nossos medos podem ser um, mas nossas tentações podem ser outras... Por isso confesso que esse “capitalismo de hoje” é bem mais tentador pra mim do que o socialismo do senso comum evangélico.

Óbvio que tenho medo de um governo marxista cuja história nos mostra que foi capaz de transformar a vida num tormento em nome de uma sociedade sem classes, exercendo tirania sobre a política, economia, cultura e religião; eu tenho medo de um governo como o Cuba, Venezuela, você não? Porém, não deveria eu também ter medo da estupidez macro de um sistema que tem compromisso com mercado e não com gente? Deveríamos ter medo da nossa “tentação capitalista” de cada dia. Mas, por que não temos tanto? Sou tentado a trocar meu celular (ainda em bom estado) por um “Iphone da vez” porque as prateleiras do shopping me dizem que tô "atrasado" (isso serve para roupa, carro, etc.); sou tentado e induzido a consumir todo veneno alimentar exposto nas prateleiras dos supermercados que, em nome do MERCADO, conscientemente redirecionam a população para um futuro calabouço hospitalar. Fico a pensar ainda, não nos causa indignação às consequências do consumo exagerado que afeta diretamente a retirada de matérias primas da natureza com a poluição do meio ambiente, resultantes da tônica da produção capitalista?

Em suma, digo, a tentação do mercado é mais intensa, mesmo disfarçada, do que o medo de um governo socialista. As artimanhas do consumismo e suas obsessões na vida comum do cristão são muito mais presentes e trágicas, em nosso contexto, do que os malefícios do comunismo conjectural. Acho que é isso que quero dizer! Ambos “ismos” são apenas roupas inadequadas que vestimos sobre conceitos que tentam gerir uma realidade chamada PECADO.

Aqui no Nordeste tem um ditado popular que diz “pau que bate em Chico bate em Francisco”. É mais ou menos isso... Cristão que critica a direita precisa atentar para a nocividade da esquerda, e vice-versa. A via segura deve ser outra, o Evangelho que dá sentido e razão para o homem e a vida como um todo! Se você quer debater qual deles hoje apresenta-se menos terrível ao homem, o faça sem retirar o conceito de PECADO em seus aspectos mais gerais possíveis e sabendo que ambos projetos de “redenção” social são falíveis e idólatras.

Mas... Sistemas políticos têm a ver com questões triviais da vida? Será? John Stott em seu livro ‘O discípulo radical’ dedica um capítulo onde fala sobre o “estilo de vida” do cristão, outro que fala sobre “simplicidade” e outro sobre o “cuidado com a criação”. Poxa...vale a pena lê-lo sem LUPA de direita ou esquerda. Vale apena ler sobre os reformadores e avivalistas sem a LUPA de direita ou esquerda e perceber que lutar por justiça social e auxílio ao pobre não é novidade de “crente esquerdopata” (é só uma questão de simetria fé e obras como adverte Tiago):
Mas dirá alguém: Tu tens fé, e eu tenho obras; mostra-me a tua fé sem as obras, e eu te mostrareia minha fé pelas minhas obras” [Tiago 2.18]

“Contra todas as formas de perversão social, contra os simulacros de ordem, contra os que abusam do poder que receberam de Deus, poder político ou poder de riqueza, contra toda forma de opressão, devem insurgir-se os cristãos e a igreja; porque o próprio Deus é adversário deles”. [João Calvino]

A migração para as cidades criou uma nova classe de moradores urbanos pobres nos dias de Wesley. A Revolução Industrial caminhava a todo vapor, alimentada pelo carvão. Ao pregar para os carvoeiros de Kingswood, Wesley estava alcançando os que foram mais cruelmente vitimados pela industrialização. Porém, a reação dos carvoeiros foi fenomenal, e Wesley trabalhou sem parar para manter o bem estar espiritual e material deles. Entre outras coisas ele abriu clínicas gratuitas, estabeleceu uma espécie de cooperativa de crédito e abriu escolas e orfanatos. Seu ministério se estendeu para incluir os mineiros de chumbo, operários de fundição de indústria siderúrgica, estivadores, peões de fazendas, prisioneiros e mulheres que trabalhavam nas indústrias”.
[Registro do teólogo Howard A. Snyder (pesquisador de Estudos Wesley no Seminário Tyndale em Toronto, Ontário 2007-2012)  a respeito de John Wesley e o avivamento em sua época]

Alguns homens demonstram amor aos outros como se fosse apenas ao homem exterior; eles são liberais no tocante às suas posses terrenas e muitas vezes dão aos pobres, mas não sentem amor ou preocupação pela alma das pessoas. Outros fingem um grande amor pela alma das pessoas, mas não são compassivos com relação ao seu corpo. [Jonathan Edwards]
Por fim, o Evangelho não coaduna com os "ISMOS". Nenhum dos antagonismos acima deve (ou deveria) ser a nossa sina, defesa ou crença de restauração. O Evangelho não veste roupa de Teologia A ou B, Missão A ou B, Política A ou B, liberalismo ou conservadorismo. Parece difícil pensar e viver isso hoje, eu sei. Lamento.

Estamos entrincheirados na base segura da nossa fé, o Evangelho: a boa nova aos homens e a sinalização do reino de Deus neste mundo. Isso deve gerar três perguntas que, a meu ver dispensa a LUPA política que tantos querem usar:

- O que eu devo dizer as pessoas do mundo? 
- Como eu posso servir as pessoas do mundo? 
- Como eu devo cuidar do mundo das pessoas?

O Evangelho nos dá as respostas. Agora preste atenção. Ante essas respostas, o que aparentar ser pauta sociológica, política ou ecológica, tenha calma, não se assuste de cara! Lembre-se que o plano de Deus para o homem e sua Criação precede sistemas sociais e políticos. Se do Evangelho emana o sentido do pensar e agir, não julgue precipitadamente se tratar de algo da “direita ou esquerda”, por assim dizer. Considere a possibilidade de ser apenas uma COBELIGERÂNCIA, isto é, “apontar para o mesmo alvo e guerrear com motivações diferentes e em trincheiras diferentes”. O Evangelho é único, é o poder de Deus. Ele não cabe e nem precisa de “ISMOS”.

Atente para o simples princípio da Cobeligerância e liberte-se dessa alergia irritante de se julgar sempre precipitadamente a partir do binômio sócio-político. Ela, a cobeligerância, existe e pode até tentar nos confundir. Porém nunca se esqueça: o cristão verdadeiro não se alia a outros projetos, pois vive numa trincheira vitoriosa!

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Antognoni Misael.