quinta-feira, 24 de dezembro de 2015

ENCONTRO E CLARIDADE (Uma canção para o Natal)


 “Encontro e Claridade” é uma canção que faz parte do “Projeto 10 Encontros”.

Sua temática está relacionada com a contrastante Graça de Deus na vida do pecador e o grande encontro que o homem pode ter com o Seu criador. Um poema cheio de trocadilhos, paradoxos e complementos. Eis a vida e seus antagonismos. Eis o Divino, o único que pode completar nosso significado de existência. Que esta canção possa clarear os bons encontros.

Encontro e Claridade

"Todo encontro tem seus desencontros
Todo canto tem seu prumo e chão
Todo cantar tem pelo menos uma canção

Todo choro cessa com alegria
Toda tempestade precede a calmaria
Toda lareira aquece o frio
Todo coração preenchido foi vazio
Isso me faz lembrar do nosso encontro

Encontro de pecado e graça
Encontro de culpa e perdão
Encontro de morte e vida
Claridade na escuridão

Todo filho pródigo retorna à casa
Todo pescador já passou por temporais
Todo peregrino um dia solta o fardo pra nunca mais (nunca mais)

Todo vinho novo quer santa folia
Toda nostalgia é boa com celebração
Toda mesa farta chama o pobre
Todo pecador, na verdade, não merece o perdão
E eu me lembro do nosso encontro

Encontro de pecado e graça
Encontro de culpa e perdão
Encontro de morte e vida
Claridade na escuridão

Todo céu escuro viu passar a estrela
Toda a humanidade recebeu visitação
Uma jovem mãe sorri segura
Seguro está, enfim, tudo em Suas mãos
O Verbo feito em carne conjugou o nosso encontro

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Cena final do clipe é resultado de uma edição da animação "Set Your Eyes" de Jonathan e Emily Martin.

Música: Misael Antognoni
Letra: Misael Antognoni, Filipe Jonhne, Marco Telles e Vilma Leite
Vocal: Misael Antognoni, Marco Telles e Vilma Leite


Direção de vídeo: César Costa

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Misael Antognoni

sexta-feira, 18 de dezembro de 2015

O SANTO E O MORALISTA

Há uma diferença muito grande entre preocupar-se com a lei e ser legalista. As escrituras aprovam -a preocupação movida pelo amor- com o cumprimento da vontade moral de Deus; e, ao mesmo tempo, condenam a obsessão neurótica com a lei, movida pelo medo. Qual a diferença entre ser santo e ser legalista?

1. O santo se relaciona com Deus em amor. O moralista procura cumprir a lei em temor servil.

2. O santo vive em liberdade sob o espírito da lei, e não no claustro do detalhismo ético. Ele vê a moral cristã à luz do conjunto mais amplo de preceitos morais e do seu escopo principal: a glória de Deus e a felicidade humana; em vez de vê-la sob as trevas da meticulosidade ética, capaz de conduzi-lo à negligência do propósito essencial da lei.

3. O santo submete sua vida ao que as Escrituras revelam. O legalista procura impressionar a Deus com tolices criadas pelo homem. Para o santo, boa obra é apenas aquela que é praticada em amor e sujeição a preceito ético claramente revelado.

4. O santo sabe que entrará no reino dos céus pelo sacrifício de um outro que foi espancado e morto em seu lugar. O moralista não consegue entender uma relação com Deus que não seja baseada em desempenho.

5. O santo cai e se levanta, confiando mais na misericórdia de Deus do que na sua inocência. O moralista só se perdoa depois de haver expiado pessoalmente a sua culpa.

6. O santo se relaciona com Deus através de Cristo. O moralista se relaciona com Deus através da lei.

7. O santo ficou viúvo da lei e casou com Cristo. O moralista mantém o matrimônio com a senhora lei.

8. O santo é cara de pau. Participa da festa do amor do Pai como se nada tivesse acontecido. O moralista recusa-se ir para o salão de festa sem antes passar pela senzala.

9. O santo usa as Escrituras para revelar o amor gracioso de Deus pelos pecadores. O moralista usa a Bíblia para justificar a sessão de apedrejamento do que pecou.

10. O santo surpreende-se com a doçura da graça de Deus. O moralista espanta-se com a estreiteza do caminho que leva ao céu.

11. O santo é bom e justo. O moralista costuma ser apenas justo. Em suma, o santo é justo, o legalista é justiceiro.

12. As crianças adoram a companhia do santo. O moralista as espanta.

13. O santo não se sente livre para ser mau porque Deus é bom. O moralista tende a ser tão mau quanto o seu Deus.

14. O santo tem sempre alguém na vida com quem pode falar sobre suas fragilidades morais. O moralista procura ocultá-las até de si mesmo.

15. O santo encontrou na vida um Deus amável a quem cultua em amor. O moralista encontrou na vida um justiceiro celestial a quem cultua de olhos secos.

16. O santo é progressista. O moralista é conservador. O santo conserva o que ainda é útil, santo e bom. O moralista conserva o que é relativo, temporal e anacrônico.

17. O santo celebra a vida. O moralista só se sente bem quando está mal.

18. O santo não busca uma santificação que o desnaturalize. O moralista tenta viver como anjo.

19. O santo surpreende-se com a condescendência divina face à sua fraqueza moral. O moralista não entende como não é mais abençoado face ao seu desempenho ético.

20. O santo se relaciona com Deus através de Cristo. O moralista se relaciona apenas com Deus. Por isso, o santo encontra o Pai, o moralista, o Diabo.

Por: Antônio Carlos Costa.

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Antonio Carolos Costa é pastor presbiteriano, escritor e presidente da ONG Rio de Paz.

terça-feira, 15 de dezembro de 2015

Projeto Sola - musicalidade reformada de qualidade



OS 5 SOLAS


O que são os cinco solas? O que eles representam? Por que colocamos o nome do nosso trabalho de "Sola"? É realmente necessário falar sobre isso nos dias atuais ou estamos tratando apenas de uma maneira cool de voltar às origens da reforma através de uma linguagem retrô ou um modismo hipster?

Os cinco solas foi o meio que a igreja reformada encontrou para determinar suas bases. Com o estabelecimento dos cinco solas a reforma rompeu com a hierarquia católica romana, com as heresias daquela época, e fez um vibrante e robusto caminho de volta à ortodoxia bíblica. São cinco estacas bem firmadas da fé cristã, baseadas na história de Deus revelada a nós, que servem de farol até hoje para a Igreja Cristã como um todo. Sola, em latim, significa somente, apenas. Os solas são:

Sola fide – Somente a fé
Sola scriptura – Somente a escritura
Solus Christus – Somente Cristo
Sola gratia – Somente a graça
Soli Deo gloria – Somente a Deus a glória

Somente a Deus toda a glória, que nos traz a redenção pela da graça mediante a fé. Fé esta somente em Cristo Jesus, a expressão exata de Deus, Verbo Vivo feito em carne, revelado somente na Escritura que o próprio Deus nos deixou. Pelo Espírito podemos entender tudo isso, e como Filhos do Pai, somos incluídos em seu Reino de amor, que é hoje e para sempre.

O Projeto Sola procura se firmar nessa fé ortodoxa, cada vez mais antiga e ainda assim nova a cada manhã. Procuramos uma fé bíblica no Filho do Amor. Sabemos que Ele é infinitamente maior que nós, o Deus poderoso, capaz de nos livrar de nós mesmos para uma nova vida plena de alegria nEle. Cremos que Ele e tão somente Ele, nos trouxe a redenção, e assim temos a esperança viva, e em vida. Cremos nEle, estamos firmados nEle, e em Sua graça podemos sempre descansar.

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Autor: Guilherme Iamarino
Revisão: Lucas Freitas
Divulgação: Bereianos

Músicas que glorificam a Deus, são fieis às Escrituras e edificam a Igreja, nós recomendamos! O Projeto Sola é o encontro de dois Guilhermes (Guilherme Andrade e Guilherme Iamarino).

Veja abaixo o clipe da música Redenção:

Outra música, por sinal lindíssima, é Isaias 53: 

 Você pode baixar na íntegra e gratuitamente o EP Sola - Vol. 1, aqui! Siga o Projeto Sola no Facebook: ProjetoSola

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Fonte: Bereianos.

sábado, 5 de dezembro de 2015

Combatendo o Legalismo com a Cruz - C. J. Mahaney

A doutrina da justificação deve ser constantemente reforçada e revisitada, como Martinho Lutero estava bem ciente. Seu duro conselho: “Bata com isso em suas cabeças de forma contínua.” Precisamos continuamente aplicar e valorizar a verdade da justificação em nossas vidas – diariamente. Se não o fizermos, vamos nos encontrar suscetíveis a um dos inimigos mais sutis e graves da Igreja: o legalismo.

 Legalismo envolve tentar ganhar aceitação de Deus através de nossa própria obediência. Nós temos somente duas opções: ou receber a justiça como um dom dado por Deus ou tentar gerar a nossa própria justiça. O legalismo é a tentativa de ser justificado através de alguma outra fonte que não seja Jesus Cristo e sua obra terminada.

Aderir ao legalismo é acreditar que a cruz era desnecessária ou insuficiente (Gl 2:21; 5:2). Se você tem sido legalista, essa é uma interpretação precisa da sua motivação e de suas ações, mesmo se você ainda concorda mentalmente com a necessidade do sacrifício de Cristo. Em nossa busca legítima por obediência e maturidade, o legalismo lentamente e sutilmente toma conta de nós, e nós começamos a substituir as nossas obras pelo trabalho acabado de Jesus. O resultado é ou arrogância ou condenação. Em vez de crescer na graça, abandonamos a graça. Essa foi a avaliação que Paulo fez da igreja da Galácia, quando escreveu: “Vocês que estão tentando ser justificado pela lei foram alienados de Cristo, vocês têm caído da graça” (Gl 5:4).

Se você já tentou viver dessa forma, você já deve ter aprendido que legalismo é tão fútil quanto frustrante. Toda tentativa legalista de se auto-justificar inevitavelmente termina em fracasso. No decurso dos anos, aprendi a reconhecer alguns sinais característicos da presença do legalismo. Aqui vão alguns deles:

• Você é mais consciente dos seus pecados do passsdo do que é consiente da pessoa e da obra acabada de Cristo.

• Você vive pensando, acreditando e sentindo que Deus está desapontado com você em vez de se alegrando em você.

• Você acha que a aceitação de Deus a você depende da sua obediência.

• Falta alegria em você. (Esse é geralmente um indicativo da presença do legalismo. Condenação é o que acontece quando pesamos nossa deficiência; Alegria é o que acontece quando consideramos a suficiência de Cristo.)

Você tem sido ludibriado pela súbita presença do legalismo? Se sim, cuidado. Ele tende a se espalhar em vez de permanecer restrito (Gl 5:9 diz: “Um pouco de fermento leveda toda a massa”). O legalismo deve ser removido.

A única forma eficaz de se desarraigar o legalismo é com a doutrina da justificação. Se você tem negligenciado ou ignorado essa doutrina, então tome alguma atitude drástica para mudar. Tire tempo dia-a-dia para revisar, reler e se alegrar nessa verdade maravilhosa e objetiva. Restrinja sua dieta espiritual ao estudo da justificação até que você tenha certeza da aceitação de Deus, segurança no seu amor e libertação do legalismo e da condenação.

A crucificação de Jesus Cristo foi o acontecimento mais decisivo da história. Sinclair Ferguson precisamente declarou o seguinte:
“A Cruz é o coração do evangelho. Ela faz o evangelho ser boa notícia: Cristo morreu por nós. Ele permaneceu no nosso lugar diante do juízo de Deus. Ele suportou os nossos pecados. Deus fez algo na Cruz que nunca poderíamos fazer por nós mesmos. [...] A razão por que nos falta segurança na sua graça é porque deixamos de focar o local onde ele no-la revelou”.
Onde você vai focar a sua atenção? Nos seus pecados do passado, no seu estado emocional atual, nas áreas de seu caráter em que você ainda precisa crescer? Ou você vai centrar-se na obra consumada de Cristo? O legalismo não precisa motivá-lo. Condenação não precisa atormentar você. Deus já justificou você.

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Fonte: Iprogido, via Blog Único Filho.

terça-feira, 1 de dezembro de 2015

Borrifou com água, limpou a poeira e nos Amou

A Graça de Deus é próxima e pessoal. Foi por ela que Cristo nos alcançou. Esta incomensurável condição do Pai nos amar a ponto de abandonar a Sua glória e morrer em nosso lugar ainda é um dos mais absurdos atos que o ser humano pode contemplar em sua existência. Por isso o Evangelho é loucura para os homens. Nos debrucemos na certeza de que o Amor do Divino é antigo e imedível.

Pensando nesta Graça, trago uma passagem belíssima da obra do funileiro de Bedford, na Inglaterra, que há mais de 300 anos foi inquietado por Deus para escrever a célebre obra "O Peregrino", falo de John Bunyan.

O livro traz um personagem central que é “CRISTÃO”, um homem que vive uma peregrinação da terra para o céu, do pecado para a salvação, e está sujeito a lutas e armadilhas. Nesta trama, CRISTÃO se depara com inimigos (Legalidade, Hipocrisia), e também com amigos, dentre eles, a segunda pessoa do diálogo que iremos notar, o “INTÉRPRETE”, que o incentiva no progresso de sua caminhada.

Veja que magnífico diálogo abaixo e contemple um dos mais belos exemplos de amor, perdão e Graça:

"Então Intérprete o tomou pela mão e o levou para uma sala bem grande, cheia de poeira, pois jamais era varrida.

Depois de examiná-la, Intérprete mandou um homem varrê-la. Ora, começando ele a varrer, o pó a ergueu tão abundantemente que o Cristão quase sufocou. Disse então Intérprete a uma jovem que estava ali ao lado:
- Traga água e borrife um pouco na sala. Feito isso, a sala pôde ser varrida e limpa com prazer.

CRISTÃO: O que significa isso?


INTÉRPRETE: Esta sala é o coração do homem que jamais foi santificado pela doce graça do Evangelho. A poeira é seu pecado original e as corrupções mais íntimas que macularam todo o homem. Aquele que começou a varrer primeiro é a Lei, mas o que trouxe a água e a borrifou, é o Evangelho. Ora, você mesmo viu que assim que o homem começou a varrer, a poeira levantou, tornando impossível limpar a sala. Você quase sufocou. Isso foi para mostrar-lhe que a lei, em vez de limpar (pela sua ação) o coração do pecado, na verdade o faz reviver, o fortalece e o amplia na alma, ainda que o revele e proíba, pois não dá força para subjugar.

Depois – continuou ele – você viu a jovem borrifar a sala com água, podendo então limpá-la com prazer. Isso é para mostrar-lhe que, quando o Evangelho entra no coração com sua influência doce e inestimável, o pecado é conquistado e subjugado, da mesma forma como você viu a jovem fazer pousar a poeira borrifando o chão com água. A alma se faz limpa pela fé, preparando-se consequentemente para que o Rei da Glória e habite."
[O Peregrino, p.35-36]

Que nunca se esqueçamos dAquele que com a água borrifou a sala de nossa alma, nos limpou de toda sujeira do pecado e nos ensinou a Sua Maravilhosa Graça.

Sem a intervenção dEle em nossas vidas a sujeira de nossa alma nos faria perecer.

Somo gratos, Aba.

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Misael Antognoni, 
Editor do Candiêro Teológico.

segunda-feira, 30 de novembro de 2015

Primeiros Frutos - Tronco, galhos e folhas desta árvore

Eu enfrentava um final de semana bastante corrido e exigente. O saldo até aquele momento era negativo para mim. Ao que tudo indicava, o final de semana estava vencendo. Esmorecido, com olhos pesados e me sentindo no tanque reserva da minha resistência, acordei. Eram sete da manhã. A banda toda amanhecia em Patos (PB). Eles partiram e me deixaram para trás. Eu mesmo pedi a eles na noite anterior que, a menos que eu os ligasse, eles não me incomodassem, pegassem estrada sem mim. Eu iria logo mais, atrasado. Foi o que aconteceu. Tive medo de dormir na estrada ou de não aguentar de tédio os 300 km entre Patos e João Pessoa. Pensei rápido, com o pouco de ideias que ainda me restavam, e decidi passar numa lan house antes de pegar estrada, para fazer o download de um disco que fora lançado há poucos dias. “Primeiros Frutos”, de Wellington Filho.

Eu conheci o Weelingon, que chamarei a partir de agora de Presba (ele sabe as razões), quando éramos ainda garotos. Portanto, depois de tantos anos, e mesmo que nunca tivéssemos tido uma relação próxima diariamente em nenhum período desses anos, eu estava ansioso por ouvir este disco. Sabia de seu potencial e queria provar seus “primeiros frutos”.

A viagem se tornou muito mais agradável e, durante os 300km de chão à minha frente, pude manter-me focado em analisar tronco, galhos e folhas dessa árvore. É com muita alegria que trago a vocês minhas percepções acerca do disco. Pode encarar como crítica mesmo. Não tenham medo. Criticar é necessário.

Do geral:

Eu qualificaria como um disco folk brasileiro com influências em algumas faixas do bom rock progressivo e uma influência de baião na primeira canção (No Começo – João 1). Também está encharcado de sugestões do espectro da música cristã que chamaria de “galera do espontâneo”. Me refiro a Misty Edwards, Morning Star Worship, Kim Walker, David Crowerd Band, Jason Upton.

O violão de Presba leva a banda o tempo inteiro com um estilo marcante e decisivo nos direcionamentos das canções. O restante da banda é formado por uma guitarra, um baixo e a bateria. Bem reduzido. Não tem participações nem instrumentos solos (exceto a guitarra já citada). Seu formato musical é tão simples e direto que me lembrou de uma professora de matemática que tive no primeiro ano médio. Ela fazia parecer fácil. Eu saia da aula com a sensação de que tinha entendido tudo. Os professores anteriores podiam até me deixar de cara no chão com a grande quantidade de conceitos e o exibicionismo de seus amplos conhecimentos matemáticos, mas eu saía sem entender nada. Portanto, a banda é agradável, suave o tempo inteiro e sensível.

A voz de Presba é um descanso para os meus ouvidos tão molestados pelos agudos tenores que encharcam o mercado fonográfico da música cristã. É um barítono que não se vê na obrigação de forçar notas agudas para além de sua capacidade só porque o mercado gosta assim. Ele passeia no médio grave o tempo inteiro deixando bem claro que conhece seu terreno e não inveja o terreno alheio.

A captação do projeto foi, como ele mesmo explica em um vídeo postado no hotsite do disco, uma gravação “ao vivo em estúdio”. É um formato que foi amplamente utilizado no passado, mas que aos poucos deixou de ser interessante por conta da busca incansável pela produção sonora perfeita. Sem ruídos, sem respiração, sem semitonadas, sem vazamentos. Isso tudo acabou criando uma fórmula para o CD “Barbie”. Perfeito, mas de plástico. As curvas e o cabelo estão no lugar, mas não respira. Hoje percebo uma tendência cada vez mais difundida entre as novas bandas de se voltar para o que conhecemos como música orgânica. Essa parada é massa. E não poderia ter sido captada em um ambiente mais propício. Foi no estúdio Peixe-boi, que já faz esse tipo de captação há um bom tempo e possui um dos maiores profissionais de nosso estado na nave de edições, Marcelo Macedo. Aliás, meu primeiro disco foi gravado lá, há muitos anos atrás, direto do túnel do tempo. A mixagem ficou excelente e as timbragens de violão e batera são de surpreender, quase padrão gringo (eu disse “quase”). Porém, a máster não tá tão legal. Acredito que não se deu tanta atenção aos volumes de uma faixa com relação à outra e, principalmente, percebo uma “quase distorção” quando o volume está muito alto.

01. No Começo (João 1) 

Começa assim. Um, dois, três, valendo! Sem introduções ou preparação. A grave voz de Presba se une ao acorde natural do violão e: “No começo(só) tinha uma palavra”. É a faixa com influência do baião. Ele escolheu o texto certo (ou o texto certo o escolheu). É tão honesto, doutrinário e poético!

“a palavra sangrou e viveu entre nós, e nós vimos a sua Glória, o Verbo de Deus”.

A linha de baixo esta bem atraente nessa faixa.

02. Só Pode Ser Jesus

Ainda estou querendo entender se é country ou Rock, ou dance. Para nenhum dos três estilos ficar triste, é os três de uma só vez. É impossível não sorrir ao ouvir essa faixa. É impossível não mexer os ombros como se estivesse na década de 30 (onde a dança era praticamente uma mexida de ombro ritmada).

Tem um solo de guitarra totalmente “irresponsável” e desleixado. Isso foi um elogio. Não dava pra ser um solo organizado e educado aqui. Não dava mesmo. Parabéns ao guitarrista por “jogar” desse jeito nessa faixa. Não acho que foi o melhor timbre, mas a gente supera essa.

A letra parece ter sido escrita por uma adolescente apaixonada pelo “príncipe encantado”. É de revigorar a alma. Me senti como se estivesse gravando aqueles comerciais de pastilha que quando você coloca na boca tudo em volta refresca.

Ele respira no meio de uma palavra! Louco! Kkk

Ele é o fo(respira)ogo, que arde no meu coração”.

É dessa humanidade que estamos precisando na canção cristã, cheia de questionável perfeição.

03. Você Me Encontrou

A música balada do disco. Essa canção começa a carregar o conceito central do projeto. Se você assistir ao vídeo do Presba (Wellington Filho) acerca desse CD você vai compreender que o projeto desse disco envolve campanha de adoção. Ele possui um filho adotivo e tenta trazer para suas canções conceitos espirituais de nossa própria adoção em Cristo. É tão honesto focar nessa doutrina. Hoje se canta de nariz empinado acerca de nossa filiação. Parece que somos filhos nascidos naturalmente de Deus. Mas não somos. Foi algo não natural. Fomos enxertados, fomos encontrados e por sua graça fomos aceitos como filhos. As canções de Presba parecem muito mais vindas de um peregrino constrangido contando como foi parar em uma família mesmo sem merecer, do que vindas de algum almofadinha que despreza cada centímetro da casa que mora, considerando entediante o convívio familiar no qual nasceu.

O peregrino Presba, adotado em Cristo pela graça, canta com cabeça baixa e olhos arejados:

“Você me encontrou à beira do caminho 
Você me encontrou desde então não sou sozinho 
Pois um sorriso em minha boca 
Esperança em meu coração 
Em meus lábios uma nova canção 
Estava perdido e fui achado 
Estava cego e agora vejo 
Estava morto e agora eu vivo só pra Ti”

04. Você Já Veio Aqui

Chegou a minha canção preferida. O Presba já lançou um vídeo no seu canal do YouTube com essa canção há alguns anos atrás. Maltratei o replay por longas semanas. É tão sincera, tão singela.

Eu não sei bem se cabe nesse texto falar de como o Presba sofreu em suas relações familiares. Mas já falei. Em seus decretos Soberanos, Deus acabou por infringir alguns sofrimentos no pequeno Presba por separá-lo de sua mãe de uma maneira tão dolorosa, e tão cedo. Separando-o também do convívio paterno quando ele mais necessitava. Se você tem esse pano de fundo, se conhece um pouco das raízes dessa árvore, acaba por ouvir essa singela canção por um prisma diferente.

“Eu sempre quis te falar 
Já se passou tanto tempo 
Você já deve saber o que passa aqui dentro 
Você Já veio aqui 
Tantas vezes eu ri 
E outras vezes chorei 
Eu sei que você já sentiu 
Sabe o que passa aqui dentro 
Você já veio aqui”

Me senti como quando eu era criança e brincava de ouvir as conversas da família pegando outra linha de telefone. Eu fazia isso com muita frequência na casa da minha vó, que era enorme e tinha vários telefones espalhados pelos quartos, sala e cozinha. Sempre que alguém estava em uma conversa eu corria pra outro ambiente e pegava outro telefone. Ficava lá, ouvindo uma conversa que não tinha nada a ver comigo.

Escutar “Você já veio aqui” me fez ter essa mesma sensação, de estar escutando uma conversa que deveria estar restrita a duas pessoas. A diferença, no entanto, é que essa conversa tem tudo haver comigo também. Essas palavras poderiam facilmente ter sido ditas por mim. Que também ri muitas vezes, chorei inúmeros momentos.

A proposição dessa poesia de Presba é a mesma do autor de Hebreus em 4.15: “Pois não temos um sumo sacerdote que não seja capaz de compadecer-se das nossas fraquezas, mas temos o Sacerdote Supremo que, à nossa semelhança, foi tentado de todas as formas, porém sem pecado algum.” Me sinto profundamente seguro quando me lembro desta lição cristã, temos alguém que sabe do que estamos vivendo, ele já veio aqui.

“Você passou pelas mesmas tentações 
Você chorou por um amigo que partiu 
Você sorriu brincando com seu pai 
Você veio aqui 
E você é Santo, nunca vacilou 
É poderoso, você ressuscitou 
Você é doce 
Você morreu por mim”.

Obrigado Presba, por essa canção. Muito obrigado mesmo.

No final da música, minha grande decepção: ela termina em fade out !! Quase jogo o carro pra cima de um caminhão na estrada de tanta raiva! Sou paranoico com esse negócio de fade out. Talvez porque eu fique pensando que em algum momento a banda terminou de tocar e eu não pude saber como foi isso. Talvez por acreditar piamente que uma música que começou merece um arranjo de finalização nem que seja “pata pata pa pixxxx”.

Essa semana passada estava no estúdio gravando uma canção com alguns amigos, que lançaremos no natal. E ai um deles sugeriu: A gente poderia terminar com um fade out! Eu falei meio transtornado: “Nada de fade out!”. Foi ai que percebi que tenho um problema. Lembram da Edna Modas, do filme “Os Incríveis”? Uma estilista paranoica com as capas das roupas de heróis. Ela gritava: “Nada de Capas!” Tô com algum transtorno paranoico com fade out.

Termino meus comentários dessa minha canção favorita parabenizando os efeitos Slides do guitarrista. Ficaram perfeitos.

05. Não Pare de Escutar

Essa canção faz um par perfeito com a anterior. “Você Já Veio Aqui” é quando Presba pega o telefone e conversa com o Pai (enquanto eu trollo tudo ouvindo da outra linha). Em “Não Pare de Escutar”, Deus responde. Que par perfeito.

“Ei, você que esta me ouvindo 
Não Pare de Escutar 
Ei, você que esta me ouvindo 
Eu tenho algo pra te falar 
Que o meu amor é bem maior do que você pensa 
E o meu perdão é na verdade o que te sustenta 
Eu sempre falei, mas as vezes você não ouviu 
Eu sempre falei, mas as vezes você fugiu 
Eu sempre falei, mas você estava longe 
Te amei e vim viver nesse mundo aqui 
Eu precisei sofrer, morrer por você enfim 
Mas eu ressuscitei 
Gritei pra que você pudesse me ouvir”

Musicalmente falando, o clima continua tão intimista e singelo como antes. Mas agora temos uma letra carregada de graça. Cristo anunciando de maneira pessoal sua graça em vir nos salvar, por amor. Sua submissão e resignação em, finalmente, ter que morrer para o cumprimento cabal de sua obra.

Quando ouvi Presba cantar a primeira frase da música: “Ei, você que esta me ouvindo, não pare de escutar”, falei em voz alta no carro: “Não paro mesmo! Só não me entregue outro fade out, por favor!”

06. Pertenço a Ti

Nessa faixa comecei a ficar com problemas para dirigir. Ela tem as influências progressivas. A cada passo que a canção te leva a dar, você sente que esta um pouquinho mais acima do chão. No final da música não vemos mais o solo. Que beleza!

Os arranjos de guitarra estão excepcionalmente admiráveis nessa faixa.Quanto ao que se canta:

Eu pertenço a Ti Senhor Jesus que me buscou e me encontrou (a adoção novamente aqui)
Eu pertenço a Ti, oh doce Deus que se humilhou e se entregou 
E eu, pertenço a Ti Sou totalmente Teu”

Essas frases me lembram de uma das doutrinas reformadas que mais me arrebatam de meus anseios e tribulações. A doutrina da “Segurança dos Santos” (ou “Perseverança dos Santos”). O mesmo Deus que com seu imenso poder se humilhou e, em solo humano, pagou o devido preço pelos pecados do seu povo, o mesmo Deus que por seu Santo Espírito regenerou seus eleitos para a condição de filhos é o mesmo Deus que com sua destra forte não permitirá que nenhum dos que Ele comprou se percam. Ele é o Deus que preserva os seus filhos em suas mãos e nada nem ninguém pode duelar com seu poder na tentativa de nos arrebatar de si. Não existe poder no céu ou na terra, ou mesmo debaixo da terra que se habilite para lutar com Deus por nossas vidas. Louvado seja o Senhor.

“Eu fui perdoado 
Eu fui restaurado 
Eu pertenço ao meu Senhor 
Eu fui redimido 
Fui justificado 
Eu pertenço ao meu Senhor 
Eu fui escolhido 
Eu fui adotado 
Eu pertenço ao meu Senhor”

Cantar essa canção com Presba no carro foi só o começo para as sensações que me invadiriam na próxima faixa, que, diga-se de passagem é grudada nesta.

07. João 6.68

Ah! Deixa eu ver se consigo falar alguma coisa sobre essa canção. É difícil. Não da pra ser justo com ela. Acredito que três páginas sobre os dois simples versos, que compõem essa canção, não fariam justiça a ela e ao que ela me fez sentir.

Só uma coisa, não aconselho ninguém a dirigir com essa canção no maior volume. É perigoso. Cantei com toda a força da minha alma. Deixei os olhos lacrimejarem, deixei os pulsos se cerrarem quantas vezes lhes parecessem certo fazê-lo. Deixei a alma vagar livremente pelo santo terreno da maravilhosa graça oferecida a pecadores eternamente condenados.

Se não fosse o teu amor 
Se não fosse a tua atenção 
Se não fosse o teu carinho, Jesus


Eu já estaria morto 

Como eu posso Te deixar? 
Só Tu tens as palavras de vida eterna

Parabéns banda, por não inventarem mais nada além do básico, do velho e bom rock quadrado. Esses dois versos não precisavam de mais nada para soarem tão forte e intenso aos nossos ouvidos. Aliás, olhando a ficha técnica, percebi que a produção do disco não é do Presba sozinho. Ele contou com o apoio do Ygor Mass. Pra quem não sabe, é o baixista da banda “9graus”. E ele, mais do que ninguém, sabe o valor de um rock repetitivo e quadrado. Ele sabe como construir a progressão dessa parada. Essa simplicidade desta canção vale muito.

Tenho cantado esses versos desde que cheguei em casa da viagem. Não me sai da lembrança. Exatamente em 2.48 Presba dá uma embargada na voz, como quem quase chora. Não aguentei. Ele embargou a voz e eu quase sou transladado no meio do sertão! Kkk

Tive a sensação de que aqueles versos não deveriam parar nunca de soarem. E então... fade out. Quando começou a abaixar o volume lentamente pedi aos montes que se lançassem por cima de mim! Por que, meu Deus?!

08. Confiança

Balançada pelo violão, tem uma forte influência do folk. Acaba sendo a música mais pop do disco. É boa, mas tive um leve levantar de orelhas quanto à poesia.

“Eu quero ter a confiança que você me deu 
No princípio quando me formou 
Quando eu não me preocupava tanto em duvidar 
Mas somente em descansar

Ao que exatamente ele esta se referindo? Acredito que a confiança que recebemos no princípio, meio que sem muitos questionamentos, é amadurecida ao longo de nossa caminhada. De modo que o “duvidar” passa a ser parte da jornada. Não um duvidar de desprezo à fé. Antes, um duvidar de questionar em função de um maior crescimento. O que estou querendo dizer pode ser elucidado melhor se nos lembrarmos do testemunho que Lucas dá acerca do crescimento de Jesus em sua juventude: “e crescia Jesus em sabedoria e em estatura e em graça diante dos homens” Lc 2.52.

De modo que, se ao escrever isso, Presba sugere que o duvidar é de todo ofensivo, então eu discordo. Mas se ele diz sobre o duvidar de “desconfiar da provisão de Deus” (o que me parece a opção mais coerente com o refrão da música), então está correto.

“E mesmo sem perceber 
Eu podia confiar que tudo tem seu tempo e seu lugar 
E vendo a criança dançar eu pude perceber que ela sabia 
Que o amanhã Deus proverá


O amanhã e o seus problemas não me assustam mais 

Eu aprendi que o depois pertence ao Pai 
Eu busco o Reino e a confiança me é acrescentada 
E o agora é quando o Pai quer me encontrar”

Portanto, acredito que a intenção de Presba era falar sobre uma confiança na provisão de Deus. Mas decidi fazer o comentário por saber que nos dias de hoje se tem uma verdadeira sina por desprezar o conhecimento dentro da igreja, assim, todos que duvidam, questionam, ou perguntam são constrangidos, e amordaçados. Como se o embate fosse de todo uma ofensa. Esses poderiam interpretar essa canção por esse viés que proponho e dizer: “É isso mesmo! Temos que parar de perguntar de mais, de duvidar de mais, de ler de mais e simplesmente confiar!! Calem-se todos os bagunceiros teológicos!”. Esse é o meu medo. Mas acredito que não foi a intenção de Presba.

09. Meu Amor

Que violão bem executado é esse na abertura da canção? Nos primeiros 10 segundos você percebe que esta diante novamente de uma nova oportunidade para flutuar.

“Você me adotou por Jesus, meu Amor maior”

A reviravolta rítmica do meio para o fim é interessante. E me fez voltar ao tempo que, na minha loucura neo-penteca, me via por horas cantando o amor de Jesus. Estão vendo? Não foi de todo ruim ter sido um louco neo pentecostal.

Presba, se você estiver lendo minha crítica, saiba que eu não vejo a hora de lhe ver tocar essas canções ao vivo, eu passarei quantas horas você julgar necessário cantando:

“E só Tu És 
E não há outro 
Tu És o meu amor, o meu amor....”

Finalizando:

Agradeço a Deus por ter ouvido este disco e visto o quanto meu querido irmão cresceu em conhecimento musical, em sensibilidade espiritual e como homem. Parabéns a todos os músicos e técnicos. O que temos diante de nós, senhoras e senhores, é um álbum autêntico, sensível e verdadeiro. Temos, na verdade, um transporte confortável e eficiente em nos levar a lugares de reflexões intimistas profundas.

Portanto, compre o ticket. Pague o que achar que vale. Faça o download. Lembre-se desse nome quando for fazer um evento em sua igreja. Quando quiser oferecer algo de qualidade e subversivo aos irmãos de sua congregação: Wellington Nascimento.

Espero do fundo do coração que estes tenham sido, de fato, apenas os primeiros frutos, porque pretendo me alimentar ainda mais de sua arte e de sua paixão à Cristo.

Com carinho,

Marco Telles
(eu odeio fade out) 

 ***
Fonte: Face do Wellington Nascimento.

Marco Telles é um dos organizadores do Candiêro Teológico, pastor da Comunidade Reformada Evangelho do Reino (CRER) e desenvolve um trabalho musical relevante na Paraíba, sempre associando a música com o conteúdo teológico.

sábado, 28 de novembro de 2015

Discipular: Mais do Que um Pregador da Internet

Pregar e ouvir o evangelho não são o bastante.

Jesus não apenas pregava o evangelho – ele o mediava. À medida que ele ensinava e servia de modelo ao evangelho da graça, o evangelho era mediado por meio dos seus relacionamentos de carne e sangue. Ele não confiava apenas nas ondas sonoras de sua voz do topo da montanha. Ele sempre descia do monte, direto para a bagunça dos pecadores do dia-a-dia. Jesus estava afeiçoado aos discípulos, os quais estavam afeiçoados uns aos outros. O evangelho se tornou viral por meio da carne e do sangue, não do silício e dos megabytes. Ele mediou o evangelho do Pai, do Filho e do Espírito Santo por meio de relacionamentos do tipo pai-e-filho com outros. A sua encarnação não foi apenas para carregar a cruz, mas também para se tornar uma pessoa a quem os seus discípulos pudessem imitar.

Paulo também trouxe o evangelho à terra ao lidar com as facções e a escatologia excessivamente realizada em Corinto. A igreja estava mais voltada para personalidades do que para pessoas de verdade, guiada por personas em vez de “geradas” por mentores que pudessem imitar. Escrevendo à igreja, Paulo contrasta os preceptores com os pais: “Porque, ainda que tivésseis milhares de preceptores em Cristo, não teríeis, contudo, muitos pais; pois eu, pelo evangelho, vos gerei em Cristo Jesus. Admoesto-vos, portanto, a que sejais meus imitadores” (1 Coríntios 4.15-16). Preceptores eram tutores contratados, ligados aos seus estudantes pelo dinheiro. Pais, contudo, são líderes relacionais, ligados aos seus filhos pelo amor. Paulo também chama a igreja a mediar o evangelho por meio de relacionamentos próximos e imitáveis.

Portanto, não é suficiente identificar-se com um preceptor do evangelho. Autores favoritos, pregadores e mestres não são suficientes para o discipulado. Mestres contratados e relacionalmente desafeiçoados não podem substituir pais afeiçoados e amorosos. Na tradição de Jesus e Paulo, a igreja precisa desesperadamente de recuperar um evangelho relacionalmente mediado. Precisamos de pais, não apenas de preceptores.

De quem é a culpa: internet ou pastores?

Atualmente, muitos cristãos se identificam com pregadores específicos por meio de podcasts ou sermões online. Ouvir esses sermões pode ser um tremendo benefício para o crescimento cristão e a profusão do evangelho. Contudo, nas mãos de pecadores, sermões online também podem se tornar um obstáculo ao crescimento. Os ouvintes podem ficar tão apegados a um pregador de fora da sua igreja que passam a se identificar menos com aqueles de dentro da sua igreja. Eles adquirem um evangelho tecnologicamente mediado, não um relacionalmente mediado.

Quando isso ocorre, os discípulos retardam o seu crescimento e a missão da igreja. Eles põem a doutrina acima da vida, em vez de cuidarem juntamente da vida e da doutrina (1 Timóteo 4.16). Quando o discipulado é dominado pela doutrina, ele tende a produzir “atletas de sofá”. Os discípulos tentam ditar as jogadas, criticando pastores locais por não serem como outros pregadores “celebridades” ou por não “fazerem igreja” como certos líderes. A comparação da internet (não a internet em si) mina a centralidade da igreja local. Em vez de ativamente procurarem líderes locais para serem discipulados, os membros de igreja passivamente ouvem os sermões de outros pregadores. À medida que “incontáveis preceptores” são reunidos em listas de reprodução de podcast, o discipulado local entra em declínio. Essa “comparação da internet” compromete o impulso discipulador do evangelho. Ela produz mais preceptores e tietes do que pais e filhos. E, o que é pior, ela representa de modo distorcido o evangelho do Deus que faz discípulos.

De quem é a culpa por essa crise? Da tecnologia? O magnata da comunicação General David Sarnoff observou: “Nós somos muito propensos a fazer dos instrumentos tecnológicos bodes expiatórios dos pecados daqueles que os utilizam”. A culpa não é da internet; é nossa. Desviar a culpa para a tecnologia não ajudará nossas igrejas a levantarem pais espirituais que discipulem outros. Pastores e não pastores confundem uma dieta de informações teológicas com um discipulado da vida como um todo. Como resultado, nós enfrentamos uma escassez de fazedores de discípulos em meio a um banquete homilético.

Tanto pastores como igrejas precisarão se arrepender.

Arrependimento para as igrejas

Há discípulos nas igrejas locais que precisam se arrepender da comparação com líderes-celebridades. Alguns precisarão confessar aos seus líderes. Outros simplesmente precisarão mudar. Estabelecendo um novo rumo, eles devem passar a afirmar a liderança de seus pastores locais e buscar maneiras de se engajarem na missão da igreja de fazer discípulos. Reconhecendo que Deus designou presbíteros e líderes para o seu bem, os discípulos devem buscar localmente um pai, ou pais, no evangelho. Esses pais no evangelho os ajudarão a crescer na graça e no conhecimento de Jesus. Procure um “pai” entre aqueles mais maduros na fé, líderes de pequenos grupos ou ministérios, ou pastores.

Em vez de buscar uma multidão de preceptores para informação, os discípulos devem procurar (e um dia se tornar) pais que discipulam para a imitação.

Embora a tecnologia em si não seja a culpada, a tecnologia pessoal certamente promove o consumidor individual. Ken Myers observa que, no Ocidente, a identidade do “discípulo de Jesus” foi substituída pelo “consumidor soberano”. Enquanto consumidores soberanos, nós escolhemos nossas influências sem nos importarmos com as influências soberanamente designadas por Deus. Nós escolhemos a teologia da internet em vez do discipulado pastoral. Nós preferimos informação isolada a transformação relacional. Embora os pecados do consumismo individualista da comparação evangélica sejam nossos, o ambiente da internet, nos quais se confia excessivamente, de fato trazem consigo esta mensagem: “Discipulado informacional é tudo de que eu preciso”.

Arrependimento para os pastores

Pastores que oferecem informação teológica à custa de relacionamentos genuínos também precisam de arrependimento.

Amigos pastores, a nossa teologia deve discipular. Ela deve se expressar em relacionamentos intencionais de mentoria. Nosso chamado é para pastorearmos não apenas por meio da pregação, mas também com pessoas. Nossos rebanhos ouvem nossos incontáveis sermões, mas será que eles têm muitos pais? Será que estamos priorizando a informação teológica, em detrimento da imitação paternal?

Jesus poderia ter transmitido o evangelho jogando uma Bíblia do céu, lançando um podcast infalível, reunindo seguidores no Twitter ou projetando hologramas de si mesmo em cada vila e cidade. Mas ele não o fez. Ele escolheu a carne, o toque, a visão, o cheiro e a presença humana. O Filho de Deus se tornou um pai espiritual para doze discípulos, a fim de transmitir o evangelho pela carne e pelo sangue. Ele nos chama a fazermos o mesmo. A pregação tecnologicamente mediada – e até mesmo a pregação em pessoa – não é o suficiente. As pessoas precisam ver o evangelho ao vivo e ouvi-lo em um “estéreo” relacional. Elas precisam da nossa presença corporal, com todas as nossas imperfeições. Os discípulos precisam de encorajamento com pulmões e de correção com coração. Todos nós precisamos de pais no evangelho que nos ajudem a imitar Jesus.

Como imitar: pais no evangelho

Talvez você esteja se perguntando: “O que é um pai no evangelho?”. Paulo via a si mesmo como um: “Eu, pelo evangelho, vos gerei em Cristo Jesus” (1 Coríntios 4.15). Um pai (ou mãe) no evangelho é alguém que assume a responsabilidade espiritual pelo crescimento de um discípulo (1 Tessalonicenses 2.7-14). Esse relacionamento ocorre quando nos unimos a alguém por meio do evangelho. Não começa porque o pai seja superior em moralidade, experiência ou espiritualidade. Começa por um compromisso comum e jubiloso com a superioridade de Jesus e sua incomparável graça para conosco. O evangelho conecta o pai ao filho, a mãe à filha em uma identidade compartilhada em Cristo Jesus.

Quando nos arrependemos e cremos em Jesus, somos convertidos não apenas ao seu senhorio, mas também somos inseridos em sua família. Essa família se assemelha a circuitos interconectados, religados a uma nova rede de relacionamentos energizados pela graça. Quando a graça está ausente, a rede se arrasta e desconecta. Pais são separados dos filhos e mães, das filhas. Os preceptores dominam. A disfunção familiar penetra sorrateiramente. O evangelho, contudo, oferece uma inacabável fonte de alimentação de graça para fortalecer os relacionamentos familiares. É por isso que precisamos não apenas de pais, mas de pais no evangelho.

Pais no evangelho são modelos de Cristo

Pais no evangelho assumem a responsabilidade por outros ao dar a seus discípulos um modelo a ser imitado. Como um pai no evangelho, Paulo exorta seus discípulos: “Admoesto-vos, portanto, a que sejais meus imitadores” (1 Coríntios 4.15; cf. 2 Tessalonicenses 3.7, 9). O autor de Hebreus recorda à igreja: “Lembrai-vos dos vossos guias, os quais vos pregaram a palavra de Deus; e, considerando atentamente o fim da sua vida, imitai a fé que tiveram” (Hebreus 13.7).

A imitação é indissociável da família. Minha filha de um ano torce os lábios do mesmo modo que eu faço quando estou pensando. Meu filho de sete anos ama explicar as coisas como eu faço, usando as mãos e tudo o mais. Como pais no evangelho, nós temos uma responsabilidade de mostrar à igreja como é seguir Jesus. Nós devemos ser modelos de Cristo. Para que as pessoas nos imitem, nós precisamos passar tempo com elas. Um encontro ocasional não funcionará. As pessoas precisam compartilhar da nossa vida, assim como da nossa fé. Elas precisam ver nossas lutas, assim como ouvem nossos sermões.

Como um pastor, as pessoas com quem passo a maior parte do meu tempo informal geralmente se tornam pais no evangelho, líderes e pastores. Por quê? Porque tempo compartilhado os expõe a um modelo de Cristo o qual, pela graça de Deus, eles podem imitar com confiança. Eles vêem Cristo por meio do modelo. Eles observam o quão desesperadamente eu preciso do evangelho da graça para refletir a imagem de Jesus. Eles me vêem frustrado e cheio de fé, desencorajado e confiante.

Quando pais no evangelho compartilham suas vidas com outros, o modelo se torna tangível e alcançável.

Fale a verdade do evangelho e ofereça um modelo

Pais também falam a seus discípulos a verdade do evangelho. Eles instruem seus filhos e lhes dão algo para imitar. Preceptores não podem oferecer imitação, porém pais sim. Pais que são presentes são os pais a quem queremos ouvir. Quando somos presentes, nossas palavras têm mais significado. Pais no evangelho vão fundo na vida das pessoas para lutar com elas e por elas na vida. Nossa experiência e exemplo não são suficientes. Elas precisam do evangelho da graça aplicado em áreas concretas e práticas de dificuldade.

Um dos homens com quem regularmente passo tempo é um profissional do campo da tecnologia. Em sua nova posição, ele se achava continuamente frustrado. À medida que fomos removendo as camadas por meio de refeições, orações e vidas compartilhadas, discernimos que ele ficava sumamente frustrado quando seu chefe desaprovava seu trabalho. Aquele exigente chefe tornava difícil que ele trabalhasse em paz. Como resultado, ele oscilava entre um senso de excessiva confiança ou de falta de confiança, a depender de como seu chefe o abordava. Eu compartilhei como a minha confiança na pregação às vezes tinha altos e baixos, a depender de como a igreja respondia. Ele ficou surpreso. Também compartilhei como eu havia encontrado grande confiança em Cristo, pois a Escritura me lembrava que, embora eu fosse inadequado para a pregação, o Espírito de Deus me tornava mais do que adequado (2 Coríntios 2.4-6). O Espírito me lembra de que a minha aprovação vem por meio de Cristo, não da igreja. Semelhantemente, a aprovação do meu amigo estava segura no evangelho, o qual o liberta para trabalhar por causa da aprovação em Cristo, não da aprovação do seu chefe. Como resultado, a nossa confiança não sobe e desce pelo que as pessoas pensam, mas descansa com segurança no que Cristo pensa. Trabalhando juntos ao longo de 1 Coríntios, fomos surpreendidos por esta promessa: “tudo é vosso, e vós, de Cristo, e Cristo, de Deus” (1 Coríntios 3.23-24). Nós temos tudo de que precisamos embrulhado no amor e na aprovação do Pai e do Filho! Agora, nós encorajamos um ao outro regularmente com essa verdade do evangelho. Ao compartilhar a minha vida como um modelo, juntamente com falar-lhe a verdade do evangelho, fez com que meu “filho espiritual” enfrentasse o desemprego notavelmente bem, mediante uma confiança mais profunda em Cristo.

Ao discipular outros, precisamos estar presentes o suficiente para fornecer um modelo, mas também precisamos ser verdadeiros o suficiente para apontar-lhes Cristo. Como bons pais, nós precisamos assegurar a nossos discípulos que eles são amados e aceitos independentemente do seu sucesso em nos imitar. Por meio desse tipo de relacionamento, outros podem ver que o evangelho da graça é suficiente para nos conduzir tanto pelo fracasso como pelo sucesso.

De que precisamos

Se a igreja há de crescer, pais devem estar presentes para serem imitados. Discípulos precisam buscá-los. Precisamos encontrar tempo com homens e mulheres que possam mediar o evangelho a nós. Pastores e líderes de igreja devem ir além de apresentar a verdade, oferecendo um modelo. A igreja precisa da verdade do evangelho e de modelos relacionais. Precisamos do evangelho mediado por pais, não apenas preceptores.

***

Texto de Jonathan Dodson

Tradução: Vinícius Silva Pimentel
Revisão: Vinícius Musselman Pimentel

sexta-feira, 27 de novembro de 2015

O Megafone de Deus

C.S. Lewis

O espírito humano não tentará entregar a sua vontade própria enquanto tudo parecer estar em ordem com ela. Agora, tando o erro quanto o pecado têm essa característica: quanto mais profundos, menos as suas vítimas suspeitarão da sua existência; trata-se de maldades mascaradas. O sofrimento é uma maldade sem máscara, inconfundível; toda pessoa sabe que há algo de errado quando está sendo machucada. [...] Contudo, o sofrimento não é só imediatamente reconhecível, mas também um mal impossível de se ignorar. Podemos até nos contentar com nossos pecados e nossa estupidez; qualquer pessoa que já tenha observado glutões engolin do as mais exóticas especiarias, como se não soubessem o que estão comendo, admitirá que é possível ignorar até mesmo o prazer. Porém, o sofrimento insiste em que nos ocupemos dele. Deus sussurra em meio aos nossos prazeres, fala em nossa consciência, mas grita por meio do sofrimento. O sofrimento é o megafone de Deus para despertar um mundo surdo.

- de The Problem of Pain [O Problema do Sofrimento]

quinta-feira, 26 de novembro de 2015

A importância da Apologética Virtual e a Ortopraxia

Há quase um ano parei de escrever assiduamente na internet. Eu quis dar um tempo. Precisava gastar mais dias lendo do que produzindo. Necessitava corrigir alguns erros e redefinir a forma pela qual eu continuaria a usar as redes sociais e o meu blog.

Esta semana a luz do candiêro reacendeu. Fiz algumas reflexões no que diz respeito à importância de não atracarmos o “barco virtual” que navega nos oceanos do mundo e que é habitado por pecadores salvos pela graça. Relembrei que vivemos em tempos onde a guerra cultural impera nas redes sociais, onde se multiplicam os falsos evangelhos, mas também, onde muitas pessoas carentes da liberdade em Cristo continuam a procura de boias para dar significado as suas existências. E como bem disse um escritor português, “um povo que lê nunca será um povo escravo”, eis a importância de materiais cristãos na internet.

Eu poderia gastar letras enumerando os pontos negativos das redes sociais e internet, bem como dos comportamentos insalubres de muitos cristãos que fazem o mau uso dela (isto fica para uma outra oportunidade). Mas, resolvo essa questão reconhecendo que, de fato, esse é um tema merecedor de uma boa reflexão, bem como, fazendo uma paráfrase das palavras de John Piper quanto àqueles que deixam de viver a vida e o Evangelho por causa da internet e suas demandas:
“Eu não acho que o Senhor dirá a alguém no Dia do Julgamento: “eu nunca te conheci porque você usou mal as ‘redes sociais’. Mas ele pode dizer: “eu nunca te conheci, porque você amou mais ‘as redes sociais’ do que a mim”.
Neste pequeno texto, quero focar apenas na importância de continuarmos a produzir material cristão e apologético para a internet. Edmund Burke, um político Irlandês bem disse que “para que o mal triunfe basta que os bons fiquem de braços cruzados”, portanto, lembremos que a igreja é coluna e baluarte da Verdade, como escreveu Paulo a Timóteo em 1Tm 3.15, por isso não podemos ignorar que os espaços virtuais ainda são uma plataforma importantíssima para a propagação da verdade a fim de libertar os homens da escravidão (Jo 8.32).

Neste árduo exercício de fazer apologética nas redes sociais, sites ou blog, a primeira coisa que não podemos esquecer é de nos reavaliarmos a fim de descobrir se não estamos sendo tentados a digitalização da piedade, a saber, que, não é a produção virtual que deve ter primazia sobre a nossa vida real cotidiana, e sim o contrário. Isto porque, observamos que, quando Paulo se valeu do meio escrito para pregar a palavra, exortar com toda a paciência e doutrina (2 Tm 4.2), bem como para combater heresias e erros doutrinários (como fez na carta aos Gálatas), o mesmo não fez de seus escritos algo estranho a si mesmo.

É interessante notar que Deus sempre usou a comunicação para edificar a igreja e libertar mentes cativas. Foi através da leitura que Agostinho, ao se deparar com os escritos de Lutero, despertou para a gratuidade da Graça. Não havia blogs ou redes sociais, o acesso a leitura não era para muitos, contudo não podemos esquecer da grande revolução que a imprensa causou naquela época. Martinho Lutero chegou a dizer que a “a maior graça de Deus na expansão do evangelho” foi a invenção da imprensa.

Ora, a internet não tem sido esse meio de graça? Ora, Deus não continua usando meios imperfeitos para a sua glória e a salvação dos homens? Fica-nos dois grandes desafios.

O primeiro é não fazer um paralelo entre a vida real e uma sociedade virtual, ou seja, entre uma teologia ideal e uma ortopraxia morta. Decerto, já existe um conceito de aldeia cristã global onde há grande interação entre jovens evangélicos do Brasil inteiro que se arriscam a escrever algum conteúdo teológico ou compartilhar materiais dessa categoria. Portanto, que cada frase ou hashtag seja um sinal de coerência quanto a vida piedosa de cada um.

Segundo, é continuarmos a produzir material apologético. Não podemos parar! “Ora, e Deus precisa ser defendido?”, talvez alguns indaguem isso. O missionário e amigo Leonardo Gonçalves respondeu a esta pergunta na obra Blogs Evangélicos - O impacto da vida cristã na internet, da seguinte maneira:

“(...) embora Deus não precise ser defendido, a fé cristã sim. E não foram os anjos que receberam a missão de preservar a mensagem incorruptível e transmiti-la a gerações futuras, e sim a igreja. Não podemos permitir que o Evangelho seja modificado, adulterado, nem aceitar uma mensagem diferente daquela contida nas Escrituras (Gl 1.8). (...) A fé cristã precisa ser defendida dos ataques das seitas, dos movimentos contraditórios e das heresias destruidoras que infestam o nosso país de norte a sul”.

Assim como aconteceu com a chegada da imprensa no século XIV, o rádio e a televisão, a internet tem sido um reduto cultural que vem transformando comportamentos e mentes. Façamos a nossa parte. O Evangelho é contra-cultura! Vivamos e não nos cansemos de pregar o Evangelho e defender a Fé!

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Misael Antognoni

Referência: Blogs Evangélicos - O impacto da vida cristã na internet.

segunda-feira, 23 de novembro de 2015

O louvor liberta?

Este assunto é oportuno pelo fato de ainda existir uma máxima no meio evangélico de que o louvor liberta. Mas, será que ele liberta mesmo? Um ímpio que passa a louvar em forma de cântico pode ter sua vida libertada do pecado e tornar-se um regenerado? Pois bem, antes de tudo vamos “acender o candiêro” e relembrar o que a Bíblia nos diz sobre o que é louvor.

O escritor de Hebreus nos dá uma dica importante ao dizer que louvor é ‘fruto dos lábios daqueles que confessam o nome de Jesus’ (Hb 13.15). Portanto, tudo que resulte numa confissão da divindade de Cristo, da excelência das obras e glória de Deus, e da presença de Jesus na vida de uma pessoa, é louvor.

O louvor é uma expressão daquele que foi regenerado, e não uma expressão para regenerar. Se atribuirmos essa qualidade ao louvor estaremos mistificando-o e colocando-o no lugar de Deus. “Então quer dizer que o louvor não liberta"? Não. Quem liberta é Cristo. Como bem disse o nazareno, “se Eu vos libertar verdadeiramente vocês serão livres” (Jo 8.36).

Talvez, alguém relute com esta ideia e traga como argumento o exemplo Davi tocando harpa para Saul a fim de alegar que o louvor libertou-o. Mas, será se Saul foi realmente liberto pelo louvor ministrado por Davi? Vejamos o texto:
“E quando o espírito maligno da parte de Deus vinha sobre Saul, Davi tomava a harpa, e a tocava com a sua mão; então Saul sentia alívio, e se achava melhor, e o espírito maligno se retirava dele” (1Sm 16.23).
Bem, o que sabemos diante dessa história é que Saul obteve temporariamente alívio devido a presença do espírito santo em Davi, mas não foi liberto. Isto porque repetidas vezes o espírito mau veio sobre ele e o problema não foi resolvido.

No capítulo 19 de 1 Samuel, Saul planeja tirar a vida de Davi e no capítulo 24 vai ao encalço dele para mata-lo. Eis a prova, o louvor não libertou Saul!

Por causa deste e de outros exemplos temos outra questão a ser redefinida: muitos ainda associam unicamente o louvor a música. Louvor é louvor. Música é música. Contudo, a música pode ser uma expressão de louvor como foi por muitas vezes tanto no velho testamento, quanto na igreja primitiva. Ora, o apóstolo Paulo escrevera vários textos em forma de hinos, como Filipenses 2.6-11 e 1 Timóteo 3.16, bem como indicou o louvor através de canções a algumas igrejas, como fez aos colossenses: “louvem a Deus, com salmos, e hinos, e cânticos espirituais, com gratidão, em vosso coração [Cl 3.16]”.

Então chegamos as seguintes conclusões: louvor não liberta; louvor não é música, mas a música pode ser uma expressão de louvor.

Pois bem, antes te apagarmos o candiêro, vale uma observação. Entendamos que Deus tem seus meios de alcançar o pecador, certo?, e nada pode impedi-Lo de utilizar um louvor que traga o Evangelho de Jesus para libertar um pecador. No entanto, não esqueçamos... quem libertou não foi a canção (ou louvor), e sim Cristo.

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Misael Antognoni.
Texto inspirado na Reformusic (Igreja Batista de Jataúba-PE), junto com o parceiro André Luis.